Ilusões subentendidas - parte final


Não queria ficar ocioso em casa no sábado e ficar pensando no jantar que viria ser à noite. No seu quarto, tinha um retrato antigo do seu pai que nunca fora desprezado. Sempre ao ir dormir o via. Deitava em sua cama e conversava longas horas com ele.

Já eram oito horas da noite. Perto da hora de irem para o jantar, sua mãe apareceu. Estava linda. De vestido preto, parecia estar bem mais feliz do que de costume.

O restaurante não era elegante. Depois de confirmar a reserva, os dois foram guiados para a mesa de reserva pelo garçom. Um homem os esperava.

Espantado com a surpresa ele o viu:

- Pai?

Sem o que responder, seu pai levantou os braços sorrindo. Feliz, não esperava que seu filho o olhasse tão friamente. Foi tentar dar enfim um abraço nele. Repulsivo, com a atitude do pai, colocou a mão no bolso. Momentos depois, sua mãe foi a primeira a gritar. Sem dizer nada, com a mão cheia de sangue, saiu correndo e não se importou em deixá-los para trás.



Brevemente quase impedido pelo segurança, olhou por alguns segundos para seu pai. De longe, dava pra ver a faca em sua barriga espetada cheia de sangue.

Não pensava em mais nada. Queria fugir e sumir. Nessa hora seu pai estaria no hospital com sua mãe. Foi pra casa e logo no seu quarto todo bagunçado, pegou todas as suas roupas e pertences e colocou dentro de uma mochila. Sua pressa o fez deixar cair uma caixa dentro do guarda-roupa. Dentro tinha umas cartas que nunca foram abertas e enviadas. Lembrou que eram cartas escritas de despedida para seu pai há muitos anos. Começou a lê-las:

17 de dezembro

“Olá papai!
Neste ano pedi ao Papai Noel que dessa vez me desse um presente diferente. Pedi a ele que me trouxesse você. Sei que ele ao passar pelo mundo a dar presentes às crianças, não se esqueceria de trazer você pra mim. Talvez ele tenha a sorte de te encontrar em algum lugar em que eu não pude achar.
Estou com muitas saudades!”

18 de dezembro

 “Papai, não acredito que apesar de tudo, você pôde morrer. Mamãe disse que seríamos uma família feliz. Mas, apesar de você não estar aqui, está no céu todas as noites parar mim. Papai, que estrela é você?”

Frustrado, pegou a caixa de madeira e colocou todas as cartas dentro. Jogou tudo na lata de lixo e as queimou. Saiu de casa com o dinheiro que tinha.

Na rodoviária, olhares incertos o fitavam. Subiu no ônibus com a passagem comprada e ninguém mais soube dele. Pela janela, dentro do ônibus indo a lugar nenhum, lembrava-se do seu pai quando era criança, morto como acreditava.